Maria Virgínia da Graça nunca aprendeu uma nota de música do tamanho de um comboio. Nem ela, nem a mãe, nem as irmãs, nem nenhuma mulher lá de casa. Pelo contrário, todos os homens da família são músicos. Nunca teve filhos, por isso foi mãe do avô, mãe do pai, mãe dos irmãos e agora é mãe dos próprios sobrinhos. Tudo músicos. Hoje, viajada e muito vivida, a Tia Graça está surda que nem uma porta. O que, numa família destas, tem muita graça. Um espetáculo que homenageia as mulheres que vivem nos bastidores das vidas de tantos músicos, a lavar, a coser, a passar, a cozinhar, a mimar. E sempre à espera. Toda a gente devia ter uma Tia Graça.
“Tia Graça” é um espetáculo de autor, concebido e interpretado por Luís Fernandes, aprofundando a matriz músico-teatral do trabalho criativo da d’Orfeu AC, num registo que congrega tradição e contemporaneidade. O inusitado naipe de sopros que acompanha as canções originais - oboé, fagote e eufónio - traz ao espetáculo as reminiscências filarmónicas que ilustram o contexto familiar da vida da personagem central, a Tia Graça, mas com uma transversal e sofisticada linguagem musical para todas as idades.
Estreado em 2017, originalmente com o trio de sopros ao vivo, cuja digressão culmina no disco homónimo em 2019, este espetáculo é agora reposto numa versão a solo, com Luís Fernandes no papel mais maduro do seu percurso criativo.
“Tia Graça” passa uma forte mensagem, com ternura e a necessária inteligência, num registo estimulante para o consumido espetador dos nossos dias. Neste espetáculo, reconhece-se a valorização tardia dos entes mais discretos, aqui trazidos à ribalta, retratando os temas da velhice e da solidão com muito humor. Uma lição de vida em palco.